Líbano inicia processo para desarmar palestinos em campos de refugiados – será que vai dar certo? | Análise

O presidente do Líbano, Joseph Aoun, e o primeiro-ministro Nawaf Salam, 11 de fevereiro de 2025 | Foto: ANWAR AMRO/AFP via Getty Images

Passos práticos sobre o tema devem começar no próximo mês. A oposição do Hamas e do Hezbollah, além da realidade complexa no terreno, representam desafios significativos

O governo do Líbano anunciou no fim de semana o início do processo de desarmamento dos grupos palestinos no país, com medidas práticas previstas para começar em meados de junho. Um comunicado oficial foi divulgado por agências de notícias e redes de comunicação árabes.

O primeiro-ministro do Líbano, Nawaf Salam, determinou que o processo seja acelerado por meio da definição de um mecanismo de implementação claro e de um cronograma específico. Fontes do governo libanês informaram ao jornal "Asharq Al-Awsat" que foi decidido, durante uma reunião, que o Exército libanês ficará responsável por executar a tarefa, começando por Beirute — especialmente nos campos de refugiados onde não há forte presença do Hamas ou de outras facções islâmicas.

Segundo a emissora de TV libanesa Al-Jadeed, o processo de entrega de armas terá início em cinco campos de refugiados, divididos em duas fases: Shatila, Mar Elias, Al-Jalil (em Baalbek), Rashidieh e Al-Badawi.

O Hamas protestou por não ter sido incluído nas negociações em Beirute com o líder da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, classificando o processo como unilateral e feito sem coordenação.

A tensão de segurança no Líbano, alimentada desde setembro do ano passado pelos confrontos no campo de refugiados de Ain al-Hilweh, atingiu na semana passada um ponto de inflexão político importante. Mahmoud Abbas visitou Beirute pela primeira vez desde o início dos confrontos e se reuniu com autoridades do governo libanês e representantes das facções palestinas. O objetivo da visita foi tentar avançar em uma das iniciativas mais ambiciosas e sensíveis da região: o desarmamento das facções palestinas nos campos de refugiados do Líbano.

O contexto político não é coincidência. Em 22 de maio de 2025, ocorreram conversas coordenadas entre o presidente do Líbano, Joseph Aoun, e Abbas, nas quais foram discutidas formas de implementar a Resolução 1701 do Conselho de Segurança da ONU. Essa resolução exige que todas as armas estejam sob controle exclusivo do Estado e proíbe a existência de milícias armadas fora da autoridade do governo libanês.

O primeiro-ministro Nawaf Salam e o presidente do Parlamento, Nabih Berri, também participaram das conversas. Trata-se de um movimento fortemente coordenado com o Fatah, a principal facção da Autoridade Palestina, mas não necessariamente com os demais grupos ativos na região — especialmente o Hamas, a Jihad Islâmica e outras facções armadas.

Nos bastidores, os Estados Unidos e países europeus vêm exercendo forte pressão sobre a liderança libanesa para avançar com o processo, deixando claro que a recuperação econômica do Líbano depende disso. O plano em discussão, segundo analistas libaneses com quem conversei, é gradual: primeiro, o mapeamento das armas e forças presentes nos campos; depois, uma coleta escalonada dos armamentos; e, por fim, o controle efetivo do Estado sobre a segurança dentro dos próprios campos. A intenção é iniciar essa etapa na segunda metade de 2025, provavelmente em agosto ou setembro.

Mas será isso realista? As avaliações são divididas. Por um lado, a iniciativa de Joseph Aoun conta com o apoio da comunidade internacional — incluindo EUA, França e Egito — e a Autoridade Palestina expressa um compromisso oficial. Fontes dentro do Fatah deixaram claro que não há mais espaço para "desordem de segurança" que comprometa a situação dos refugiados no Líbano e os arraste para conflitos indesejados.

Por outro lado, o Hamas e o Hezbollah demonstram oposição aberta ao plano. O secretário-geral do Hezbollah, Naim Qassem, declarou há cerca de duas semanas que "qualquer tentativa de desarmar a resistência, sob qualquer formato, enfrentará resistência popular". Segundo analistas palestinos no Líbano, essa afirmação não se refere apenas ao arsenal do Hezbollah no sul do país, mas também à influência no sistema político palestino dentro do Líbano. O Hamas, atualmente em confronto aberto com a liderança do Fatah, também deve exigir garantias de que seu poder militar e político nos campos — especialmente em Sidon e no norte — não será prejudicado.

Atualmente, o Líbano abriga 12 campos de refugiados palestinos oficialmente reconhecidos, com mais de 200 mil refugiados, além de dezenas de milhares que vivem fora dos campos. Na maioria desses campos há alguma forma de presença armada — seja do Fatah, do Hamas ou de outros grupos, como o Ansar Allah ou facções de esquerda. Desarmar essas forças, mesmo que simbolicamente, exigirá amplo consenso e uma capacidade de aplicação da lei que ainda não está claro se o Estado libanês, em sua frágil condição política, possui.

Alguns veem a visita de Mahmoud Abbas como uma tentativa final de resgatar a influência institucional palestina no Líbano, antes que ela seja totalmente suplantada pelo Hamas. Outros alertam para uma possível disputa de poder perigosa, que poderia arrastar o Líbano novamente para confrontos armados internos — seja entre facções palestinas, seja entre essas facções e o exército libanês.

A analista libanesa Ghada Al-Halawi publicou um artigo no site libanês Al-Modon, no qual escreveu: "As armas palestinas no Líbano são a primeira linha de defesa para as armas do Hezbollah."

O ano de 2025 pode ser lembrado como o momento em que o Líbano tentou iniciar uma ousada revolução na segurança dentro dos campos de refugiados. Mas, até agora, o caminho rumo a essa mudança se assemelha a uma travessia por um campo minado.

O sucesso do plano depende não apenas da determinação política do governo libanês, mas também do nível de envolvimento e da pressão que países árabes e a comunidade internacional — liderada pelos Estados Unidos — estarão dispostos a exercer. Estariam os grupos armados no Líbano dispostos a abrir mão de um de seus principais ativos estratégicos? Isso deve se revelar em breve, mas parece ser uma missão das mais difíceis.

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