Como Jerusalém se tornou um símbolo para todas as religiões abraâmicas

Palestinos religiosos rezam próximo à Cúpula da Rocha no complexo da mesquita de Al-Aqsa, durante as primeiras orações de sexta-feira do sagrado mês muçulmano do Ramadã, em Jerusalém, em 10 de maio de 2019. (Foto: EPA/Alaa Badarneh)

Antes do Dia de Jerusalém, exploramos o que levou religiões além do judaísmo a tornarem a cidade sagrada

Às vésperas do Dia de Jerusalém, celebrações por todo Israel marcam a libertação da cidade com cerimônias em seus diversos bairros. Nesse contexto, buscamos compreender melhor a afirmação de que Jerusalém é sagrada para o Judaísmo, Cristianismo e Islamismo. A cidade é realmente tão sagrada para as três religiões na mesma medida? E existem outras religiões ou grupos que também consideram a cidade sagrada?

Para investigar isso, conversamos com dois especialistas em religiões e sua conexão com a cidade — o professor Eyal Ben Eliyahu, da Universidade de Haifa, e a doutora Daniella Talmon-Heller, da Universidade Ben-Gurion.

Judaísmo: a santidade se desenvolveu gradualmente

O professor Ben Eliyahu começa observando que, mesmo no Judaísmo, Jerusalém se tornou sagrada mais tarde do que se acredita comumente, e esse processo foi lento.

"Na Bíblia, nos Cinco Livros de Moisés, Jerusalém não é mencionada nenhuma vez. Esse é um ponto interessante em que a Torá e o Alcorão se igualam — pois a cidade não é citada em nenhum dos dois. O primeiro lugar onde Jerusalém aparece é no Livro de Josué, mas mesmo ali não há uma relação especial com a cidade. A primeira vez que ela se torna sagrada é quando o Rei Davi traz para lá a Arca da Aliança. Depois dele, o Rei Salomão constrói o Templo na cidade. Mais tarde, no Segundo Livro das Crônicas, é mencionado que o Templo foi construído no Monte Moriá. Essa referência nos remete à história do sacrifício de Isaque e reforça a santidade da cidade", explicou o professor Ben Eliyahu.

Manifestantes desfraldam bandeira gigante de Israel na Praça do Muro das Lamentações, na Cidade Velha de Jerusalém, em 25 de maio de 2025, véspera do Dia de Jerusalém. (Foto: Menahem Kahana/AFP)
Manifestantes desfraldam bandeira gigante de Israel na Praça do Muro das Lamentações, na Cidade Velha de Jerusalém, em 25 de maio de 2025, véspera do Dia de Jerusalém. (Foto: Menahem Kahana/AFP)


O professor Ben Eliyahu acrescenta que, após o período bíblico, surgiu a questão de por que Jerusalém é tão pouco mencionada nele. Maimônides respondeu que a cidade foi mantida oculta para evitar disputas entre as tribos e para que as nações do mundo não desejassem conquistá-la. Os sábios do período do Segundo Templo e depois também intensificaram a santidade da cidade, estabelecendo diferentes círculos ao seu redor — o Monte do Templo como o mais sagrado, depois toda a cidade, e por fim toda a Terra de Israel.

Cristianismo: uma santidade problemática, política e complexa

O professor Ben Eliyahu enfatiza que a santidade de Jerusalém para o Cristianismo foi estabelecida por motivos políticos.

"Ao examinar a atitude cristã em relação a Jerusalém, vemos que ela é muito complexa. Jerusalém rejeitou Jesus como Messias, e ele também profetizou a sua destruição. Jesus foi crucificado na cidade e nem sequer dormiu lá quando chegou. O Cristianismo foi formado na Galileia — por isso até hoje o Papa não dorme em Jerusalém quando visita a Terra Santa. Os cristãos falam da Jerusalém celestial. Quem, no entanto, santificou a cidade, principalmente por razões políticas, foi o imperador bizantino Constantino, durante cujo reinado foi descoberta a localização da crucificação de Jesus, na Igreja do Santo Sepulcro", explicou o professor Ben Eliyahu.

Uma peregrina cristã repousa a cabeça no altar durante oração na Missa de Páscoa, na Igreja do Santo Sepulcro - local onde, segundo a tradição, Jesus foi crucificado e sepultado - na Cidade Velha de Jerusalém, em 20 de abril de 2025. (Foto: AP/Mahmoud Illean)
Uma peregrina cristã repousa a cabeça no altar durante oração na Missa de Páscoa, na Igreja do Santo Sepulcro - local onde, segundo a tradição, Jesus foi crucificado e sepultado - na Cidade Velha de Jerusalém, em 20 de abril de 2025. (Foto: AP/Mahmoud Illean)


A Dra. Talmon-Heller acrescenta que o processo de santificação da cidade começou porque Jesus atuou e foi crucificado ali.

"Helena, mãe de Constantino, descobriu por meio de um milagre o local da crucificação e a cruz na qual Jesus foi crucificado. Ela construiu a igreja no local. Durante esse período, o Cristianismo não tinha interesse no Monte do Templo, mas quando os Cruzados chegaram, eles viram os edifícios islâmicos no Monte do Templo — a Cúpula da Rocha e a Mesquita Al-Aqsa — e se apropriaram do lugar para si. Inicialmente, o rei de Jerusalém residia ali, e depois a ordem dos Templários. Além disso, a santidade cristã também foi fortalecida com o estabelecimento da Via Dolorosa, o caminho que Jesus percorreu até a crucificação, pela ordem franciscana durante o período mameluco", explicou a Dra. Talmon-Heller.

Peregrinos católicos e clérigos participam da Missa de Páscoa na Igreja do Santo Sepulcro - local onde, segundo a tradição, Jesus foi crucificado e sepultado -, na Cidade Velha de Jerusalém, em 20 de abril de 2025. (Foto: AP/Mahmoud Illean)
Peregrinos católicos e clérigos participam da Missa de Páscoa na Igreja do Santo Sepulcro - local onde, segundo a tradição, Jesus foi crucificado e sepultado -, na Cidade Velha de Jerusalém, em 20 de abril de 2025. (Foto: AP/Mahmoud Illean)


Islamismo: Santidade imediata, mas diferente

Quanto ao Islamismo, a Dra. Talmon-Heller observa que a santidade de Jerusalém foi imediata desde o início do Islã.

"De fato, Jerusalém não é mencionada no Alcorão, mas foi a primeira direção de oração de Maomé durante os primeiros 12 anos. Já em 692, a Cúpula da Rocha foi construída, e mais tarde também a Mesquita Al-Aqsa — ambas em grande esplendor. Jerusalém é o terceiro local mais sagrado no Islã, depois de Meca e Medina, por isso há peregrinações islâmicas e investimento contínuo no seu desenvolvimento por parte dos governantes muçulmanos", afirmou a Dra. Talmon-Heller.

No entanto, entre os xiitas, a atitude é diferente.

"Entre os xiitas, a concentração é em torno dos túmulos dos imãs, descendentes de Maomé. O local de sepultamento do filho de Ali, na cidade de Karbala, é considerado mais sagrado que Jerusalém aos seus olhos, e há até indícios de que é mais sagrado que Meca. Por isso, os xiitas dedicam menos atenção a Jerusalém", explicou a Dra. Talmon-Heller.

Vista da Cúpula da Rocha (Al-Aqsa) a partir do Monte das Oliveiras. 02/05/2025 (Foto: Mahmoud Illean/AP)
Vista da Cúpula da Rocha (Al-Aqsa) a partir do Monte das Oliveiras. 02/05/2025 (Foto: Mahmoud Illean/AP)


Religiões e seitas adicionais

Além das três religiões monoteístas, descobriu-se que há também outros ramos, principalmente aqueles que se separaram do Cristianismo, que santificam Jerusalém.

O professor Ben Eliyahu explica que os mórmons — uma seita meio cristã, meio pagã, com múltiplas divindades — santificaram Jerusalém.

"Eles tentaram se estabelecer ali ao longo dos anos, em parte porque, segundo sua tradição, os fundadores da religião saíram de Jerusalém rumo aos Estados Unidos. Por isso, a cidade simboliza para eles uma ideia espiritual. Além disso, há também uma consideração prática — grupos que mantinham presença na cidade recebiam muitas doações e peregrinos", afirmou o professor Ben Eliyahu.

Ele acrescenta que também houve uma seita utópica protestante americana-sueca que atuou na cidade durante o período otomano — a Colônia Americana.

"Esse grupo, que atuou no século XIX, defendia a igualdade de propriedades e um regime interno rigoroso. Mais tarde, foi dissolvido, e seus descendentes hoje são proprietários do famoso Hotel American Colony na cidade", disse o professor Ben Eliyahu.

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